A alma solar de Hana Lerner

Evidenciando toda a bossa carioca de seus projetos nas redes sociais, a arquiteta instiga o público e seus clientes a um olhar lúdico e artístico do briefing à execução
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Amante dos esportes e fiel ao lifestyle carioca, a arquiteta Hana Lerner, 35, se define como uma alma solar, apreciadora da leveza e da vida. Conhecida pela sutileza lúdica de seus projetos infantis, a profissional tem um portfólio voltado para os mais diversos estilos e ambientes, sempre com um toque natural e característico.

Há mais de 7 anos à frente de seu escritório, Hana pretende ampliar ainda mais seu alcance (que, de forma online, já é nacional) a partir da criação de um curso próprio e de novas parcerias voltadas inicialmente para o maior centro urbano do país, São Paulo. Indo além, a arquiteta, formada pela PUC Rio e com passagem pela Paris-Malaquais, democratiza o acesso à arquitetura e do design com os insigths de seu dia a dia para mais de 130 mil seguidores do Instagram.


REVISTA DECOR – Como você iniciou na arquitetura?

HANA LERNER – Essa escolha foi se construindo desde que eu era pequena. Minha mãe me mostrou o mundo das artes plásticas, museus, exposições, mostras – os assuntos decoração e moda sempre foram predominantes na minha casa –, e eu escolhi a arquitetura. No meu primeiro dia de aula na faculdade eu me apaixonei, eu lembro que no final desse primeiro dia eu pensei: “ainda bem que eu escolhi essa faculdade”, porque no 3º ano (do ensino médio) fica aquela dúvida sobre não saber o que quer ainda.

DECOR – Além de arquiteta, você também é uma influencer, com mais de 100 mil seguidores nas redes sociais e milhares de curtidas nas fotos e nos vídeos de seus projetos. Como você interage com esse público e o que essa troca te proporciona?

HANA – O papel da influenciadora foi muito natural, porque eu gosto de falar sobre arquitetura, eu sou muito apaixonada pelo que eu faço. Acho que poder mostrar isso para as pessoas e ter essa troca é muito legal. Não sei se influencia no processo criativo, mas um dos pontos altos da página são os encontros com pessoas diretamente ligadas aos projetos, clientes, fornecedores, amigos e arquitetos. No fundo é essa experiência que fica, além do encontro com o público, porque seria diferente se eu estivesse fazendo esse trabalho só para o meu cliente. Ter essa troca com o público é inspirador, me dá gás para continuar filmando, enfim.

Logo no início, algumas pessoas no TikTok comentaram que já identificavam quando um projeto era meu. E eu achava que eu fazia um projeto tão diferente do outro, porque eu penso em construir um sentido para o cliente. Então esse feedback foi muito curioso: já ter minha identidade e meu público reconhecer isso antes de mim. Mas eu queria gravar muito mais. Hoje, por exemplo, eu já fui para vários lugares, estive em 5 reuniões, não consigo mostrar nem metade das coisas que eu faço, mas seria bacana se eu conseguisse.

DECOR – E qual é essa identidade? Qual a sua assinatura?

HANA – Eu uso muitos materiais naturais. Madeira, pedra, cimento, ladrilho hidráulico… acho que minha identidade está em usar esses materiais e compor uma mistura deles.

DECOR – A arquitetura é conceitualmente considerada uma arte, e você carrega em seus projetos um Q artístico não somente através da paginação dos ambientes, mas também nas pinturas, formas geométricas e, principalmente, nos ambientes infantis, um toque lúdico. Se não fosse arquiteta, o que você seria? Se manteria na arte?

HANA – Eu teria que trabalhar com arte de alguma forma com certeza. Mas o arquiteto é um artista mais racional. Acho que não tem outra opção, acho que eu só poderia ser arquiteta. Mas trabalhar com arte é o que eu venho buscando no meu trabalho. Mesmo depois você começa a ver que a arquitetura se dá através da arte, a experiência que você tem do lugar onde você está, ao falar de arquitetura… todas essas vivências agregaram na possibilidade de projetar. Porque a arquitetura pode ser um trabalho muito mais sensível que de fato mudar ambientes, então eu busco cada vez mais trazer essa pincelada de arte e de vida para a arquitetura.

DECOR – Entrando no universo lúdico: é impossível dissociar o seu trabalho do ambiente infantil, talvez o seu maior nicho de projeto. Embora os clientes sejam adultos, imagino que você escute muito as sugestões e necessidades das crianças. Como é essa relação com o público-alvo e o que você já conseguiu aprender ouvindo as sugestões deles?

HANA – Os pais tendem a achar que não é muito importante. “Ah, deixa eu contar o que eu quero”, alguns dizem. Mas eu gosto muito de escutar as crianças, porque às vezes é ali que eu vou escolher a cor do quarto, ou uma pincelada. O universo da criança é muito lúdico, então quando ela me conta coisas, assim, muito fantásticas, eu capto e adapto de alguma uma forma ao projeto. Às vezes pode ser um quadro, a cor, a composição do enxoval, alguma coisa que inspire. Eu gosto muito de escutar os pequenos clientes, faz parte do meu momento de criação também.

Inclusive, tive um mini cliente que entendia tudo de arquitetura – tinha 6 anos! – ele me descreveu o quarto dos sonhos para ele, e eu achei muito lindo. Até disse que ia chamar ele para trabalhar comigo (risos). Teve uma outra cliente – estamos entregando o quarto dela agora – que ficou encantada com o projeto, a mãe dela falou que ela só fala disso e que quer ser arquiteta também, foi muito bonitinha a experiência.

DECOR – Você tem algum cômodo preferido quando o assunto é projeto de interiores? Ou você prefere projetos completos?

HANA – Cozinha é uma coisa muito legal de projetar – quer dizer, tirando quarto infantil, que é meu xodózinho –, acho que cozinha é o coração da casa. Eu sempre gosto de trazer para a cozinha uma personalidade particular, às vezes é um revestimento diferente ou o uso da cor, a marcenaria bem detalhada, com alguma bossa, então a cozinha é bem bacana de projetar.

Área gourmet e área externa também. Não é todo cliente que tem, mas quando a gente vê um potencial de criar essa extensão. E no Rio de Janeiro é bem gostoso de projetar a área da varanda, porque a gente tem o privilégio de ter essa vista, o entorno, as montanhas, então acaba sendo um projeto com muita inspiração.

DECOR – Como funciona o seu processo criativo e o seu processo de projeto e execução?

HANA – A primeira coisa que faço – e acho que é muito importante, é de onde o projeto nasce – é a conversa com o cliente, o briefing, eu fico sensível para entender qual a personalidade do cliente os sonhos que ele tem, uma conversa extensa para, de fato, mergulhar no universo dele e poder criar. O próximo passo do nosso processo de criação é o estudo do melhor o layout, das composições e dos materiais que vamos usar naquele projeto para, só depois, o projeto se desenvolver de fato. Também apresentamos sempre o projeto 3D para os clientes, porque se só de olhar o espaço eu já consigo imaginar como vai ficar, para o cliente mesmo o 2D às vezes fica difícil. O 3D ajuda a explicar melhor como vai ficar o projeto.

Outra coisa que eu amo, mas na execução, é a obra. eu sou apaixonada em estar na obra, e me pego no meio daquela bagunça, com um monte de gente passando por todos os lados, aquele caos e eu penso: “nossa como eu adoro estar aqui”.

DECOR – Como você organiza todas essas etapas?

HANA – No início, que a sensibilidade de: “qual vai ser a cara desse projeto?”, eu crio e oriento a equipe. Eu falo o sentido em que o projeto vai caminhar, e eu gosto muito da troca, quando eles me apresentam e a gente escolhe o que entra, o que não entra, o melhor layout. Esse início eu acho muito importante e gosto de participar ativamente. Depois, o restante do andamento eu oriento e coordeno, mas nós temos pessoas para cada área, decoração, execução, complemento da obra e etc.

DECOR – Muitos profissionais da arquitetura se aventuram pelo design de mobiliário e pelas artes plásticas, você pensa em assinar criações para esse nicho?

HANA – Tenho, desde o meu primeiro projeto. A gente sempre detalha a marcenaria e, ao longo desse tempo, tiveram mobiliários que as pessoas pediam. Mas eu nunca desenvolvi isso de forma comercial, só no projeto de interiores. Então tenho vontade sim de ter uma linha ou uma peça assinada, uma poltrona, é o sonho de toda arquiteta (risos).

DECOR – Você tem o privilégio de ser a arquiteta de diversas celebridades e influenciadores. Como é para você projetar para essas personalidades tão visadas – e que evidenciam o seu trabalho no dia a dia – e como é o retorno que você tem deles?

HANA – Eu acho que os clientes que têm essa característica pública, famosos, confiam no meu trabalho porque eu trato eles como trato todos os meus outros clientes. Meu desejo é que o cliente sempre seja muito bem atendido, eu sempre quero mais estrutura para poder atender os clientes da melhor maneira. Não acho que tenha uma pressão a mais, porque projetar é algo muito natural, então da mesma forma que eu vou escutar o cliente que é advogado, eu vou escutar o cliente que é uma figura pública.

Eu acho que cliente fácil e difícil tem dos dois lados, tem aquele cliente que não é figura pública, mas que pode dar uma dor de cabeça. E o Bruno Gagliasso, por exemplo, é meu cliente que mais flui, que aprova projetos na primeira apresentação. Os diálogos são sempre: “tá lindo amei, pode executar”, “Bruno, não quer mudar nada?”, “não, tá lindo”, acho que o trabalho cresce muito aí.

DECOR – Você tem algum projeto favorito?

HANA – Tem alguns, realmente os do Bruno ficaram bem especiais, o rancho, o quarto dos filhos dele no Rio, o quadro da Titi, o quarto do Bless e Zyan, foi muito divertido.

A área gourmet que a gente fez agora no Rio, ficou bem legal, com uma piscina quadrada, é um projeto que eu gosto bastante. E é muito gostoso ver o antes e o depois, eu sinto o maior prazer de ver aquele apartamento acabado e pensar “que delícia, vamos transformar tudo”.

DECOR – Qual foi o briefing para o projeto do Rancho da Montanha e Casa do Lago, e a reconstrução daquela estrutura pré-existente?

HANA – Na verdade, a casa não estava lá, o Duda Porto fez o projeto da casa, mas ela foi construída toda do zero. E o cliente pediu algo diferente de Rio, São Paulo ou Brasília; ele queria realmente um rancho, algo rústico, com ambientes integrados, para uma família cheia de vida. Esse foi o briefing, e ele falou: “eu confio que você pode fazer e traduzir o que a gente gosta”.

Então o projeto de arquitetura da casa, o layout, já era incrível – o Duda é um profissional muito bacana, eu admiro muito o trabalho dele –, e o que a gente fez foi contextualizar com o entorno do rancho, das cores e da funcionalidade. A gente teve liberdade para trazer essa vida e atender o briefing que os clientes queriam. No rancho a gente fez esse projeto de interiores, com crédito de arquitetura para o Duda.

O projeto da Casa do Lago, a gente já tinha aprovado e o Bruno disse “cara, tem essa ruína aqui, vamos transformar isso”, e eu falei “vamos”. Virou o xodozinho, é uma casa pequena, de apenas 40 m² e que ficou um charme, parece que você está na Toscana. Fizemos um projeto de revitalização, mas sem perder essa característica. Acabou que é quase tudo novo, porque a casa estava demolida, mas o perímetro, o entorno, a alvenaria e a arquitetura antigas foram mantidas.

DECOR – Você tem inspiração em alguma referência profissional?

HANA – Tem dois. Desde o início da faculdade eu gostei muito do arquiteto italiano Renzo Piano, a beleza da arquitetura dele está no detalhe e como ele leva isso à uma grande escala e faz tudo funcionar. Existe uma beleza na precisão e no detalhamento, as vezes a gente fica impressionado como a forma; e quem é arquiteto, quando olha os detalhes, sabe ver que aquilo ali foi muito bem pensando.

Paulo Mendes da Rocha até hoje é uma grande inspiração para mim, eu amo a arquitetura dele. Porque ele usa muito concreto e cimento e eu comecei a perceber que eu me identificava muito com esses materiais ao natural, como eles são. Você coloca o concreto, pinta, deixa exposto… então ele é uma grande inspiração. Mas eu me inspiro muito também nas artes plásticas.

Bom, entre outros arquitetos contemporâneos que eu admiro muito e que me inspiro, o Isay Weinfield e o Arthur Casas são profissionais que sempre trazem arte para a arquitetura. Você olha a entrada de uma casa que poderia ser simplesmente um hall, mas é uma experiência. E eles já estão em um lugar de ter grandes projetos e de poder materializar essa experiência, mas às vezes você não precisa ter tanto para fazer isso. Então, o meu olhar está sempre nisso, como deixar a arquitetura mais artística, com personalidade e promover uma experiência mais rica. É o que eu valorizo nos projetos e o que eu busco trazer nos meus também.

DECOR – Quais seus planos para o futuro?

HANA – Esse ano vamos lançar um curso online, já tem muitos pedidos, então a gente já tá aqui em produção desse curso. E às vezes as pessoas não sabem, mas eu já faço projetos em São Paulo há uns 6 anos. A minha primeira cliente lá fez um quarto infantil e desde então não paramos de fazer projetos; esse ano essa minha primeira cliente vai abrir uma loja infantil e nos contratou para fazer o projeto também, e foi muito bacana esse retorno com um projeto tão significante, um projeto comercial. São Paulo é área de atuação em que a gente está cada vez mais em expansão. Eu faço projeto em todo Brasil, mas esse ano quero reforçar essa presença em São Paulo e o curso online também.

DECOR – Pode nos contar um pouco mais sobre esse curso?

HANA – Posso! Ele vai ser temático. O primeiro vai ser como montar um quarto infantil. Então dentro de tantas áreas que a gente gosta de trabalhar – como, por exemplo, reformar uma casa, construir casa na serra, área gourmet, cozinha, etc. –, os primeiros projetos ficaram conhecidos pelo quarto infantil, então pensei em abrir com esse tema.